segunda-feira, 21 de setembro de 2009

DO SITE "CAROS OUVINTES", DE FLORIANÓPOLIS

(Publicado
por
Antunes Severo
em Astros e Estrelas, Fotos, Gente e Rádio)



Quem é Agilmar Machado
21/09/09

Dos desafios que tenho lançado nesses seis anos de Caros Ouvintes, muitos têm encontrado eco e produzido resultados que se traduziram em matérias que até hoje continuam sendo acessadas. Hoje, com muita alegria apresento o depoimento de um dos predecessores do radiojornalismo em Santa Catarina, com particular e marcante passagem por várias emissoras do sul do Estado. Agilmar, metódico e cuidadoso, começa anotando o detalhe do questionário que lhe enviei: 1ª. Parte da 2ª pergunta:

“O profissional da comunicação”


- Tenho a dizer duas coisas, abrindo essa segunda etapa do nosso papo, caro Severo.
A primeira: tenho imensa saudade do meu início profissional, dos dias antigos da Criciúma de ontem, muito diferente da cidade maluca que conhecemos hoje. Às vezes relaciono, na memória, aqueles que comigo conviveram naqueles belos tempos. Belos, apesar das agruras decorrentes do dinheiro curto e do trabalho responsável, bem orientado pelo mano Ariovaldo, e colhendo – como padrão – os exemplos de profissionais que já estavam há muitos anos “na estrada”, como meu saudoso mano César, os também saudosos, Carlinhos Lacombe, Sílvio Bittencourt, Sebastião Pieri, Gandréa Netto (pseudônimo de um inteligente Pastor protestante); de pessoas simples como Darci Antonelli e Aristides Madeira (ambos operadores de áudio, na época, “controles de som”). O primeiro foi também discotecário de rara sensibilidade para aqueles tempos: antes de programar cada música (78rpm), a ouvia atentamente, objetivando observar se o disco estava perfeito e era apropriado para o horário aprazado.

A segunda: é ter experimentado, no rádio, a fase que sucedeu o primeiro receptor que se conhece, a “galena” (apenas um transformador que emitia voz em sua vibração, como os velhos transmissores de ondas médias), e na imprensa, o período imediatamente posterior ao “prelo”, ou “prensa”, onde eram impressas, uma a uma e manualmente, as páginas dos jornais. Alcancei, no entanto, a máquina impressora manual e a de pedal.
O interior não tinha o privilégio, ainda, de máquinas impressoras elétricas. Na sucessão dos nossos 60 anos de labor na imprensa e no radiojornalismo, passamos dessa fase para as impressoras elétricas, com seu operador – após montada e posta na calandra a “chapa”, imprimia uma página por vez.

Bem, logo depois, já devidamente “iniciado” na vida prática, meu espírito libertário almejou outros vôos, mais altos, mais ousados, embora – de certa forma – incertos para os meus recém completados 17 anos de então. Um dos mais fabulosos e inteligentes homens que conheci na vida profissional, ao, ouvir-me, na Eldorado, não titubeou em falar com o mano Ariovaldo almejando conseguir minha transferência para a Rádio Difusora de Urussanga (hoje Marconi), ainda por instalar.

Aprendi muito com o então Padre Agenor (depois Cônego e, mais tarde, Monsenhor) Mesmo sabendo-me não muito “chegado” a qualquer princípio religioso, não abriu mão da minha contratação, celebrando um contrato que me levaria à pacata Urussanga. Papai assinou meu contrato, pois eu ainda era de menoridade. A rádio estava ainda em fase de montagem, mas, mesmo assim, para garantir meu concurso, fui contratado.

Assisti – desde os primórdios – a instalação da emissora.

Para isso veio a Urussanga o engenheiro Sidney Moratto, proprietário da Elmo – Eletrônica Moratto -, de São Paulo, permanecendo ali até os testes finais da emissora e sua aferição pela ZZP-2.
Permaneci ali por quase três anos.

Depois de 50 anos (em 2002) quando foi comemorado o cinqüentenário de fundação da emissora, fui convidado especial e lá estive. Senti retornar ao passado distante. Um bolo de 50 metros, sobre uma mesa de igual dimensão, se alongava na Praça Anita Garibaldi, onde estava instalado o palanque oficial.

Por razões que não perguntei, Padre Agenor não estava presente. Tão logo terminou a cerimônia, segui direto para os aposentos do velho cura, já numa cadeira de rodas, em seu pequeno escritório, dedicado aos seus livros e também defendendo teses sobre apicultura, sua paixão antiga.

Seriam 18h30 e às 19h00 haveria uma novena em sua capela particular (na própria casa, antiga “Casa da Menina” por ele fundada). Com o carinho com que ele (e seus pais saudosos) sempre me dispensaram, sentenciou: “Meu filho, quero que estejas na novena de hoje, na primeira fila. Tenho um segredo de 50 anos para te contar em público (esse “público” fiel eram os que conheciam toda a história da Rádio Difusora e a minha todos de avançada idade)”. Como negar? Acatei o convite, porém, sob condição: “Padre Agenor, estarei na sua novena, mas o senhor terá que ir andando, amparado em meu ombro, até ao altar”!

A emoção tomou conta de seu semblante. Homem decidido que sempre foi, mesmo alegando fazer alguns anos que não se levantava daquela cadeira, para andar, retrucou-me: “Você venceu a “parada. Se me deixar cair “vou te processar”, brincou.

A cena foi assistida por pessoas que cuidavam dele e as levou às lágrimas. O padre, auxiliado, aos poucos foi desdobrando as pernas atrofiadas e, apoiado no meu ombro, deu alguns vagarosos passos, dizendo: “acho que podemos tentar chegar à capela…”. E chegou!

Uma cadeira o esperava no altar. Ele sentou. A novena começou e foi chegado o momento mais emocionante do ato litúrgico que, no final, foi motivo de júbilo para todos os presentes, quando Padre Agenor disse: ”Está nesta capela hoje, dia do aniversário de 50 anos da antiga Rádio Difusora de Urussanga, uma pessoa que tenho como se fosse meu filho. Uma pessoa cuja maviosidade de voz impressionou-me tanto, mesmo antes de inaugurar a rádio, o “slogan” que já vinha sendo difundido através do alto-falante da Igreja e nas missas, teve que ser acrescido com a sua chegada: de “A voz da terra dos vinhedos”, para, “A voz DE VELUDO da terra dos vinhedos”.

Este hoje renomado jornalista e literato, membro de uma academia de letras e possuidor de uma carreira inigualável na imprensa, está sentado na primeira fila. Mesmo sabendo-o meio “rebelde” com a Igreja, ele virá a este altar ler um trecho do jornal “Domingo”.
E caçoou: “sua voz pode não estar tão maviosa como há 50 anos, mas, tenho certeza, mesmo meio “arranhada” (sic), faz inveja a muitos locutores de hoje”.

Havia cerca de 100 fiéis na capela. A emoção foi geral. Um coro infantil veio homenagear-me com duas belas canções. Foi organizada uma fila (na capela) para me abraçar e cumprimentar. Abracei-me ao bondoso cura, sem conseguir conter as lágrimas. Nem ele. O ato ultrapassou o meu poder de conter emoções e a natural frieza do profissional de velha tarimba…

(Publicado
por
Antunes Severo
em Astros e Estrelas, Fotos, Gente e Rádio)

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